A MORTE ABSOLUTA

Morrer.

Morrer de corpo e de alma.

Completamente.

Morrer sem deixar o triste despojo da carne,

A exangue máscara de cera,

Cercada de flores,

Que apodrecerão – felizes! – num dia,

Banhada de lágrimas

Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.

Morrer sem deixar porventura uma alma errante...

A caminho do céu?

Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?

Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,

A lembrança de uma sombra

Em nenhum coração, em nenhum pensamento.

Em nenhuma epiderme.

Morrer tão completamente

Que um dia ao lerem o teu nome num papel

Perguntem: "Quem foi?..."

Morrer mais completamente ainda,

– Sem deixar sequer esse nome.

BANDEIRA, Manuel. Poesia Completa e Prosa. Rio de Janeiro: Cia. José Aguilar, 1967, p.300.

Previous Next