MENINO DE ENGENHO

José Lins do Rego

Carlos de Melo, já adulto, relata de uma forma saudosa a sua infância, quando era apenas o menino Carlinhos, que perdeu a mãe, assassinada pelos desvarios do pai, e fora morar no engenho Santa Rosa, de propriedade do avô materno, o Coronel José Paulino.

Criado inicialmente pelos dengos da tia Maria, Carlinhos passava a maior parte do tempo dividido entre o comportamento mais divino, terno e maternal de sua companhia e o convívio mais extrovertido e libertino dos primos, que revelavam a ele uma face mais carnal do engenho, sempre marcada por alguma travessura.

Carlinhos conheceu no engenho do avô um mundo totalmente diferente: desde as desigualdades sociais que moldavam a figura dos empregados e seus conflitos familiares e sociais, até a força da natureza agindo sobre aquela terra tantas vezes castigada. O cangaço também se fazia presente nas lendas e na realidade do engenho, de modo a aguçar a mente do menino a ponto dele mesmo pedir ao cangaceiro Antônio Silvino para segui-lo junto ao bando, quando da visita deste.

Carlinhos também vai conhecer personagens que marcariam profundamente suas lembranças, como a velha Totonha, com suas histórias, e o negro Passarinho, que vivia cantando bêbado.

Conheceu ali também o amor, primeiramente expresso pela figura pálida e doente da prima Lili, que veio a falecer muito criança. Logo viria uma outra prima do Recife passar alguns dias no engenho, chamada Maria Clara. Menina da cidade e um pouco mais velha que Carlinhos, contava ao menino suas grandes diversões e novidades vistas na cidade, durante os longos passeios pelas terras. Desses passeios, nasceu seu primeiro beijo. Quando a prima voltou para Recife, o menino sentiu na pele a perda da primeira namorada. Logo sentiria a perda da Segunda mãe: o casamento da tia Maria, que o deixaria aos cuidados da austeridade da tia Sinhazinha, mais fria e austera. Austeridade que se torna uma libertinagem maior, quando Carlinhos se inicia e se aprofunda no sexo a ponto de contrair, aos doze anos, gálico. A única saída para tanta rudeza é o colégio, que Carlinhos não tarda a ir, mesmo forçado.

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