NOVÍSSIMO PROMETEU

Eu quis acender o espírito da vida,

Quis refundir meu próprio molde,

Quis conhecer a verdade dos seres, dos elementos;

Me rebelei contra Deus,

Contra o papa, os banqueiros, a escola antiga,

Contra minha família, contra meu amor,

Depois contra o trabalho,

Depois contra a preguiça,

Depois contra mim mesmo,

Contra minhas três dimensões.

Então o ditador do mundo

Mandou me prender no Pão de Açúcar:

Vem esquadrilhas de aviões

Bicar o meu pobre fígado.

Vomito bílis em quantidade,

Contemplo lá embaixo as filhas do mar

Vestidas de maiô, cantando sambas,

Vejo madrugadas e tardes nascerem

– Pureza e simplicidade da vida! –

Mas não posso pedir perdão.

MELO Neto, João Cabral de (org.). Murilo Mendes - Antologia Poética. Brasília: INL, 1976, p. 28.

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