Ergue-se a lua na cerúlea tela
Rutilam astros e palpita o mar,
Abrem-se os seios da magnólia bela,
Fecham-se as palmas do gentil palmar!
É bela a noite: tem a brisa – afagos,
Verdura – os prados, os jardins – festões;
Brando, amoroso latejar os lagos,
As brancas fadas do luar – canções!
Estruge ao longe a cachoeira enorme,
Vem sobre as penhas em cachão ferver!
Enquanto a terra embalsamada dorme,
Eu vou saudoso ao bandolim gemer!
E vejo sempre a pensativa imagem
Da linda filhados sonhares meus,
Dormida ou quieta na gentil folhagem,
O corpo em terra, o pensamento em Deus!
Cisma – e não sente na dourada trança
Passar gemendo o merencório sul;
Ri-se – blandícias d'infantil criança,
Chora – é a lua no celeste azul!
Dorme – num berço de verdura e flores
A nívea garça dos vergéis do céu!...
Jesus! eu vejo-a a palpitar d'amores
E sempre envolta do pudor no véu!
Huri tão pura – dum gentil serralho
Dorme indolente nos rosais em flor!
Solta a madeixa – tem no lábio o orvalho,
No seio as ondas de inocente amor!
Eu vejo-a sempre! na saudosa calma
Rápida some-se a gentil visão!
Minh'alma busca conhecer su'alma,
Buscam meus beijos só beijar-lhe a mão!
CORREIA, Raimundo. Poesia Completa e Prosa. Rio de Janeiro: Editora José Aguilar, 1961, p.101-102.