SONETO

Não se passa, meu bem, na noite, e dia

Uma hora só, que a mísera lembrança

Te não tenha presente na mudança,

Que fez, para meu mal, minha alegria.

Mil imagens debuxa e fantasia,

Com que mais me atormenta e mais me cansa...

Pois se tão longe estou de uma esperança,

Que alívio pode dar-me esta porfia!

Tirano foi comigo o fado ingrato,

Que crendo, em te roubar, pouca vitória,

Me deixou para sempre o teu retrato:

Eu me alegrara da passada glória,

Se quando me faltou teu doce trato,

Me faltara também d'ele a memória!

COSTA, Cláudio Manuel da. Obras Poéticas. Nova edição, contendo reimpressão do que deixou inédito ou ainda esparso, um estudo sobre sua vida e obras por João Ribeiro, da Academia Brasileira de Letras. t.I: Sonetos, Éclogas, Epístolas, Fábula e Epicédio. Rio de Janeiro, H. Garnier- Editor, 1903. t.I, p. 117

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