A CATEDRAL

Entre brumas, ao longe, surge a aurora.

O hialino orvalho aos poucos se evapora,

Agoniza o arrebol.

A catedral ebúrnea do meu sonho

Aparece, na paz do céu risonho,

Toda branca de sol.

E o sino canta em lúgubres responsos:

"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O astro, glorioso segue a eterna estrada.

Uma áurea seta lhe cintila em cada

Refulgente raio de luz.

A catedral ebúrnea do meu sonho,

Onde os meus olhos tão cansados ponho,

Recebe a bênção de Jesus.

E o sino clama em lúgubres responsos:

"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

Por entre lírios e lilases desce

A tarde esquiva: amargurada prece

Põe-se a lua a rezar.

A catedral ebúrnea do meu sonho

Aparece, na paz do céu tristonho,

Toda branca de luar.

E o sino chora em lúgubres responsos:

"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O céu é todo trevas: o vento uiva.

Do relâmpago a cabeleira ruiva

Vem açoitar o rosto meu.

E a catedral ebúrnea do meu sonho

Afunda-se no caos do céu medonho

Como um astro que já morreu.

E o sino geme em lúgubres responsos:

"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

GUIMARÃES, Alphonsus de. Obra Completa. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1960, p. 289.

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